terça-feira, 13 de maio de 2014

A Maior Idade!!!



Enternecemo-nos com uma criança porque ela está no princípio da vida, tudo nela promete surpresa e futuro, e nós enternecemo-nos porque ela é um sinal da nossa esperança. Não sei por que razão não nos
comovemos com a pessoa que atingiu uma idade maior se a sua vida relata como cumpriu a esperança daqueles que a viram nascer. Talvez o mundo e as relações entre as pessoas mudassem para muito melhor, se no rosto de cada um vislumbrássemos a criança que em si foi e continua a ser. Frágeis e inocentes sobre o papel que nos cabe, até ao fim da vida, incluindo o período da nossa maior pujança, nunca deixamos de ser um início de pessoa disfarçado de gente grande. Mais do que um mistério do corpo, esse é um labor do tempo. 

Aquilo de que a pessoa da idade maior necessita é, sobretudo, de continuar a acreditar que o seu corpo, o seu espírito e o seu labor ocupam um lugar que ninguém mais, na cadeia do tempo, ocupa por si. Precisa de ter consciência de que constitui uma linha de força na vida, que desempenha um papel e representa uma esperança. Não acredito que uma sociedade que retire a ideia de importância ao idoso, possa lidar amigavelmente com os seus maiores aliados, a infância e a juventude. 

Idade maior, idade de viagem, idade de sabedoria. Mais do que isso. Sabe-se por demais como o vigoroso terá sido pequena pessoa, se acaso não se inscreveu na corrente contemporânea para partilhar e ser útil. Quando a pessoa deixa o seu trabalho formal, nada o impede de procurar ser útil.

Ser útil, estar entre os outros e fazer parte do grupo onde os outros estão, inscrever-se numa totalidade maior do que a sua pessoa, e do que a sua família, manter-se na rua para se associar aos ecos que o mundo dá de si, em cada instante, constrói a pessoa cujo passado se confunde com o futuro que traz consigo.

Deveria divulgar-se a ideia de que ser velho não é uma especificidade, é um cúmulo da idade onde se somam todas as qualidades de que somos feitos. Demonstrar aos próprios a evidência da utilidade do seu papel é a primeira obrigação que uma comunidade sábia deve ter para com os mais velhos. Um dia, no futuro, quando saber mais significar aplicar melhor, essa harmonia que hoje se procura não há de ser uma elaborada utopia, há de ser apenas uma saudável realidade.

 Lídia Jorge - A Maior Idade

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